"Escrever é estar no extremo
de si mesmo." João Cabral M. Neto
NOITE DE ANO NOVO
Era dia…amanheceu…meus olhos ainda
cerrados resistiam em despir-se depois da noite itinerante do dia anterior.
Eles estavam radiantes, ardentes e alegres como criança no ápice de uma
gargalhada desmedida. Era noite de ano novo, noite em que as verdadeiras
famílias se abraçavam e juntavam-se para celebrar a chegada de um novo ano. O
bairro ***** estava festivo e alegre, as famílias pelas ruas estreitas unidas
se espalhavam em grupos, vestiam branco, simbolizando a paz e a esperança de um
ano melhor com muito dinheiro no bolso (geralmente, para pagar as dividas
advindas do ano anterior). Na casa éramos quatro: Eu, uma bisavó, uma tia e uma
prima, as duas últimas de segundo e terceiro graus respectivamente. Ínfimos
laços consanguíneos de família que a noite e a ocasião trataram de corrigir,
éramos enfim uma família suburbana feliz. O relógio que caminhava lentamente
seguindo o ritmo de um último dia de ano, marcava sete horas da noite. A casa
de esquina permitia uma visão privilegiada das ruas e vielas que formam o
bairro *****. Dentro da casa uma procissão em limiar, minha bisavó que tinha lá
seus 99 anos, estava deitada a rezar o rosário de Nossa Senhora de Fátima, da
qual era devota. Minha tia e prima certamente seguiriam a velha, que sentada em
sua rede adverti-as em replicas e treplicas: --- oh! ***** vai se aquetar muié
! ladainha que se não me falhe a memoria teve êxito. Eu estava a espera de uma
amiga, que também é a protagonista desta crônica, aqui vou-lhe atribuir o
pseudônimo de ******* , pois acho hoje inapropriado citar seu nome aqui,
deveras ser simples e popularmente usado no diminutivo sintético, o que o
tornava um vocativo mais apropriado e bonito até. Marcamos as 7:30 da noite,
ela chegou as 7:31, minuto que pouco tempo depois recordei ter adiantado no
oficio do ajuste, teria eu adiantado 53 segundos do meu relógio...estava
explicado! Ela chegou pontualmente as 7:30 como tínhamos combinado. Despedi-me
da minha tia, que tratou logo de advertir-me para que tivesse cuidado e e não
voltasse tarde de mais. O caminho entre as duas casas era pequeno, pude
estimular que caminhada não tenha durado mais do que três ou quatro minutos,
nesse intervalo de tempo o silêncio foi o maior falante. Ela era de estatura
mediana, tinha olhos pretos, pele clara, aparência física ideal para as jovens
daquela época. Ela era bonita. Ao se aproximarmos de sua casa, pude com a visão
ainda um pouco vesga, (a miopia foi um
obstáculo a parte) perceber que tinha um grupo de pessoas reunidas, deduzi que
conversavam sobre virada de ano, parentes ou coisas do gênero. Nos aproximamos
como dois estranhos (assim acredito foi o que deduziram), não que isso tivesse
efeito decisivo no prolongar da noite. Cordialmente a família dela
recepcionou-me, grato fiquei. Estávamos enfim reunidos, eu e ela um pouco mais
afastados dos demais. O grupo que dantes vesgamente vi, eram de três ou quatro
pessoas feitas, entre elas a mãe, uma tia e um tio e o outro que não consegui
deduzir que grau de parentesco pudesse ter, e próximo a estes um grupo com três
ou quatro crianças que antes não estavam ali. ******* estava graciosa e parecia
mais alegre do que minutos antes quando caminhávamos, concomitantemente os
monossílabos redundantes deu lugar a frases feitas, e por fim o que mais nos
preocupávamos, que dualmente denominamos de assuntos. A Casa dela localizava-se
a cinco esquinas, tendo por incio de contagem a esquina de tia *****. Era uma
casa simples, mas com traços marcantes de um sobrado, e intimamente assim o
classifiquei. Os assuntos que era nossos diálogos sobre quaisquer coisas, foram
inúmeros, mas prazerosos. Conversamos sobre família, livros, gostos,
universidades e claro sobre a virada do ano novo. Deter-me-ei sobre os mais
relevantes.
A rua ******* ****** era uma das mais
conhecidas do bairro. E naquela noite parecia a mais alegre e festiva do
bairro. Entre vizinhos e redondezas tinha os que eram mais conservadores (nos
quais também se enquadravam meu conceito de família já citado), normalmente
eram senhores e senhoras de idade, tínhamos a juventude infantil (no qual se
enquadra o grupo de crianças acima citado), o grupo que eu denominei Juvenis
que eram os jovens entre treze e dezoito anos, os adultos e por fim os
evangélicos que com certeza rivalizaram contra um grupo de pessoas com
vicissitude mundanas, que comemoravam a virada de ano numa casa frontal a
igreja. No outro dia fiquei sabendo por ****** que a farra tinha causado uma
terrível pertubação sonora e tinha entrado 2012 a dentro.
O cotidiano daquelas quatro horas
revelou de maneira astuta e extrovertida na figura de um lunático, um senhor
magro e inofensivo, e aparentemente amigável, que nos legou bons risos e
atenção constante e abrilhantou um pouco a noite que corria célere. O fator
silêncio coexistiu obviamente, mas, de forma tímida. A principio era consenso
entre nós de que eu não demoraria mais que duas horas, mas, o consenso foi
engolido pela noite e pelas insistências dela para que eu retarda-se a volta. A
principio resisti, porém nesta batalha que insaciável, tornei-me impotente e
passível.
O grande momento aproximava-se, todas
as famílias que antes estavam mas dispersas, se aglutinavam, ansiosas para ver
aqueima de fogos, um espetáculo pirotécnico que marca a passagem de um ano para
outro. O semblante de ******* ficou num tom de expectativa, o que a deixou mais
formidável e ao mesmo tempo mais inquieta. Finalmente meia-noite e o show de
luzes clareou o céu negro daquela noite de ano novo, dando uma textura
inigualável de cores de matizes diversas. Foi nesse momento que de impeto
decisivo, decidi retornar e acompanhar a procissão da minha bisavó que
naquelas alturas já deveria estar
voltando do calvário.
Autor : Francisco Cruz (Mateus)
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